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QUOTIDIANO

7 de Agosto de 2018 | José Augusto Pacheco
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Opinião

Quando for escrito o percurso factual e perspético do festival rock de Paredes de Coura, se bem que as imagens e os textos de entrevistas, e muitos mais ainda de opinião em jornais, sejam, desde já, documentos preciosíssimos, será fundamental considerar os primeiros festivais, organizados na década de 1970.

Se o atual festival começou em 1993, muito devido ao João, ao Vítor, ao Filipe e ao José, bem como a outras pessoas, com um sucesso ímpar, granjeando crescente notoriedade a nível nacional e internacional, a primeira fase teve início em 1977, tendo sido uma chuva passageira, mas que deixou marcas profundas.

Transportei comigo, num caderno dos tempos da universidade, quando os apontamentos eram essenciais para se saber o que se passara aula, estando ainda distante o ambiente digital, o autocolante do 2º festival rock, ocorrido a 12 de agosto de 1978, no campo de futebol do S. C. Courense, recentemente inaugurado nesse tempo e que substituíra o velhinho campo do Testo.

Para muitos courenses, passou a ser um autocolante com um certo ar de rebeldia e fetichismo.

Participaram neste evento: Clã, Arte e Ofício, Tantra, Abralas+Very Nice, Pesquisa. Embora não tendo qualquer registo do 1º festival, recordo-me da presença inconfundível de Rão Kyao, no seu inconfundível registo de voz.

Falando com pessoas que estiveram na organização, constata-se que foram tempos de verdadeira audácia, ou seja, de tempos em que tomar uma decisão assim representava dar um verdadeiro tiro no escuro.

Em 1976, quatro amigos (as coincidências existem!), já saídos da adolescência, pensaram num evento que fosse diferente, talvez impulsionados pelo festival de música de Vilar de Mouros, realizado a 7 e 8 de agosto de 1971, com a presença, entre outros, de Elton John.

Sonharam bem alto. Anteciparam a presença de dez mil pessoas.

Estiveram muitas, de facto, o sucesso foi enorme, o festival começara o seu caminho e a semente tinha sido lançada à terra, para germinar um dia mais tarde, com mais força e de forma mais sustentada, sem a carolice dos primeiros tempos, em que contava exclusivamente a boa vontade dos organizadores e de muitos mais que ajudavam nas mil e uma tarefas necessárias para que tudo desse certo.

Há um facto curioso: de modo a angariar dinheiro, a organização preparou cerca de dez mil sandes. Muitas delas ficaram intactas, por falta de compradores. Diz-se que até os cães da Vila ficaram enjoados de tanto queijo e fiambre.

Depois deste primeiro tempo de germinação da ideia, há um outro facto que tornou possível o atual festival.

O Taboão como praia fluvial e recinto verde que atraía milhares de pessoas era uma realidade, depois de uma intervenção bem pensada da Câmara Municipal, que fez um trabalho notável. Dos campos de milho, que chegavam ao rio, nasceu um amplo espaço verde, acarinhado por todos.

O palco natural existia. O anfiteatro estava a inventar-se. Faltava recomeçar.

E isso aconteceu em 1993, para não mais parar.

E Coura agradece!

 

PS: em entrevista, divulgada pela agência Lusa, o Presidente da Câmara Municipal, Vítor Paulo, afirmou que o Mundo ao Contrário atingiu o ponto de maturidade, precisando apenas de manter a qualidade. Aqui está um bom exemplo daquilo de que Coura é capaz de fazer, e muito bem, sobretudo quando os responsáveis têm ideias e são audazes, cultural e politicamente.

 

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