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RESENDE. TOMÁS E ALBERTINA, 65 ANOS DE PAIXÃO

23 de Julho de 2024 | Fátima Ferreira
RESENDE. TOMÁS E ALBERTINA, 65 ANOS DE PAIXÃO
Destaque

Celebraram este ano 65 anos de casados, os nossos amigos Tomás Pereira e Albertina Cunha. Residentes na Rua Sra. da Piedade em Resende há cerca de 30 anos, foi também nesta freguesia, precisamente no Lugar da Barroca, que nasceu Tomás Pereira, há 90 anos. O aniversário ainda está fresco, e por isso queremos parabenizar o simpático nonagenário, que cumpriu no dia 8 deste mês, 90 primaveras. Nem todas foram floridas, mas tem sido toda uma vida repleta de aventuras, histórias para contar e sobretudo um exemplo de vida para admirar.

A história do casal começou ainda antes do longínquo ano de 1959, do bem lembrado dia 5 de Janeiro, dia do matrimónio de ambos, celebrado em Cunha, freguesia natal de Albertina. Tinham começado a namorar há um par de anos, numa espadelada do linho. Albertina chegava por essa altura de Lisboa, para onde tinha migrado aos 13 anos com os tios, e aos 16 voltava à terra acompanhada pelo seu irmão, doente. Já não regressaria a Lisboa. Aqui era feliz, nos bailaricos e nos trabalhos agrícolas, era uma jovem alegre, conta-me: “Nessa altura era assim que se arranjavam os namoricos”. Mas este seria especial, foi o Tomás o escolhido para ser o seu companheiro de vida. E que vida! O início foi atribulado, logo no primeiro ano nasce o primeiro filho e 18 meses depois o segundo. Assim se tornam pais de José Cândido e João Alberto. Tomás trabalhava desde os 14 anos como sapateiro na oficina do Armando Sapateiro na nossa vila, que empregava mais de meia dúzia de aprendizes. Tendo aprendido o ofício, e já depois de casado, decidiu rumar a Lisboa à procura de uma oportunidade de trabalho melhor.

Da crónica que Albano Sousa tão bem escreveu acerca deste nosso conterrâneo em Janeiro de 2022, no NC, intitulada “Courenses que tem história – Tomás Pereira o homem da Gaita de Foles”, podemos ler na íntegra a história muito bem contada, pelo que passo a transcrever um pequeno trecho, convidando o leitor a reler o original. “Sem nada organizado, mala de cartão na mão, chega à capital, onde se foi encontrar com o Serafim, um conterrâneo da freguesia de Bico, proprietário de uma sapataria na capital, com dois empregados, um alentejano e outro algarvio. Sem trabalho para o tempo todo nessa sapataria, rumou então até Queluz, onde permaneceu 8 dias. Entretanto, o referido Serafim decidiu emigrar para o Brasil e propôs-me a compra do negócio… estabelecido por conta própria, conheceu um casal de quem se tornou amigo. Passados uns tempos, esse amigo de nome Fausto, decidiu emigrar para terras holandesas. Mais tarde, numas férias em Portugal, ele fez-se acompanhar por um holandês. Chegado a Lisboa, o homem descontrolou-se nos gastos e deu por si sem dinheiro, socorrendo-se então do Tomás, através do amigo Fausto. ‘Emprestei-lhe 32$50’, diz. ‘Foi através desse holandês, de nome John, que rumei até á Holanda, à procura de novas aventuras. Para trás ficaram Lisboa e a sapataria’.”

Foram precisos ainda mais 2 anos para a esposa se juntar ao marido na Holanda. Os primeiros tempos foram de adaptação, sendo o idioma o maior desafio. O primeiro trabalho de Tomás foi num hotel, e logo no primeiro dia deu origem a uma história engraçada, que ele costuma contar. A patroa, uma senhora de idade já avançada, dava-lhe ordens e fazia gestos em direcção a umas cadeiras. Ele não sabendo o que ela pretendia, sentou-se numa das cadeiras. Ela, de imediato lhe pegou num braço, lhe colocou uma cadeira na mão e o encaminhou para arrumar as cadeiras. Pois foi assim que percebeu o que tinha de fazer! Nesse hotel trabalhou durante 6 anos e meio, antes de passar por uma fábrica de metal, e só depois conseguir colocação na KLM, a maior companhia de aviação holandesa. Albertina também se adaptou bem ao país, onde trabalhou num Lar de Idosos pertencente ao Estado. O único problema foi a sua saúde, a bronquite asmática, que mais tarde, em 1987, os obrigou a regressar a Portugal. Fixaram residência em Lisboa, Mem Martins, onde permaneceram 8 anos. Depois regressaram às origens, à terra natal de ambos, onde vivem até hoje. Os seus dois filhos, também nascidos em Paredes de Coura, acabaram por crescer e estudar na Holanda, e também eles encontraram na KLM o seu futuro profissional. Constituíram as suas próprias famílias, e acrescentaram a esta família de 4, mais 3 netos e 3 bisnetos. Em Maio deste ano, foi a mais recente visita dos nossos conterrâneos à família alargada, de onde voltaram de coração cheio. Durante o Verão terão a visita dos filhos e netos e bisnetos, e os mais pequenos vão-se deliciar, com certeza, com as artes do bisavô. É que para além de saber tocar Gaita de Foles, o Tomás também é artesão. Tanto constrói moinhos holandeses como teares e carros de bois. Tem em casa um pequeno museu que sendo fruto de um passatempo, é um trabalho belíssimo que até já foi alvo de uma reportagem televisiva para o Porto Canal! Este passatempo conta já com mais de 40 anos, e sendo o sonho de criança de Tomás ser carpinteiro, ainda que tenha começado por ser sapateiro, penso que este sonho foi sem dúvida alcançado! Parabéns a este casal pelos 65 anos de vida em comum, onde o companheirismo e o respeito são os ingredientes base, e o sentido de humor a cereja no topo do bolo.

Para surpresa do homenageado casal, quero deixar estas palavras, escritas pelos filhos e enviadas para mim, desde a Holanda, onde se encontram: “Eu e o meu irmão Alberto fomos educados com os valores da honestidade, respeito, ajuda ao próximo e espírito de sacrifício, no sentido de trabalhar para conseguirmos a nossa independência. Valores que durante a nossa vida nos têm ajudado bastante e que por nossa vez passamos aos nossos filhos. Queríamos agradecer aos nossos pais por nos terem ensinado dessa forma, pela ajuda no princípio das nossas vidas, quando estávamos a formar as nossas famílias. A distância geográfica marcou uma grande parte da nossa vida, mas estamos gratos por nos podermos visitar frequentemente. O que traz bons momentos ao chegar, é certo que gera sempre tristeza na partida. Com estas palavras enviamos um grande abraço aos nossos pais e o desejo de mais anos de vida, repletos de saúde e sempre com a nossa presença. (José Cândido)”

 

 

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