Decidi, na sequência da minha última crónica, escrever sobre redes sociais, mais concretamente acerca da “persona” que nelas criamos. Vivemos tempos em que as redes sociais são a praça pública do nosso quotidiano, onde quase toda gente vai. Li recentemente um artigo de uma jovem chamada Marina Keegan, que explorou a dependência das redes sociais e deparei-me com uma ideia inquietante: é nas redes sociais que moldamos as nossas sósias, versões filtradas e cuidadosamente curadas da nossa existência
Ao publicar algo nas redes, raramente partilhamos a totalidade da nossa história. Seleccionamos momentos, enquadramos imagens e ajustamos palavras, contamos uma narrativa com o nosso ponto de vista. Mostramos aquilo que queremos que os outros vejam. É como se tivéssemos um espelho mágico que nos permite mostrar a versão mais interessante, mais feliz ou mais impactante de nós mesmos. No entanto, esse filtro constante pode ter consequências.
O perigo está no vazio que essa prática pode gerar. Quando investimos tanto tempo e energia a criar a nossa identidade no digital, podemos perder a conexão com quem realmente somos fora dessa narrativa. Ao revelarmos apenas partes da nossa essência, acabamos por reduzir a nossa complexidade e tornarmo-nos prisioneiros daquilo que projectamos. Além disso, há um risco inerente à privacidade. Mostrar demais, onde estamos, o que fazemos ou até o que pensamos, pode expor-nos a vulnerabilidades inesperadas.
E quem está do outro lado? Não sabemos. Por detrás de um perfil pode estar um amigo, mas também pode estar alguém a lutar contra as suas próprias frustrações e que vê no espaço virtual uma oportunidade de despejar essas emoções nos outros. Ao revelarmos um fio do nosso eu, tornamo-nos alvos fáceis para quem busca validação ou alívio das suas angústias. Há pessoas que, na tentativa de se sentirem aceites ou superiores, exploram e atacam a vulnerabilidade alheia, mesmo que essa “vulnerabilidade” não seja algo real, são capazes de tornar uma afirmação inocente em algo “grave”, um aspecto em algo a esconder um objectivo, em algo cómico e inalcançável.
O grande paradoxo das redes sociais é que, ao mesmo tempo que nos ligam, também nos isolam. Criamos sósias que habitam este espaço, mas que, muitas vezes, não nos representam na totalidade. É importante lembrar que a nossa essência vai muito além do que conseguimos publicar. Zelar pela nossa privacidade e segurança não é apenas uma questão de autopreservação, mas também uma garantia de que continuamos a ser donos da nossa narrativa, sem entregá-la por completo ao mundo virtual.
As redes sociais são ferramentas poderosas, mas como qualquer ferramenta, exigem cuidado. Afinal, o que vale mais: sermos aceites pelo que mostramos ou pelo que realmente somos? Não interessa a resposta a esta questão, uma reflexão basta para que possam acreditar que aquilo que são é o que mostram ser e muito mais. Somos seres humanos e desenvolvemo-nos, mudamos fisicamente e psicologicamente, por isso não somos tão constantes como as sósias que criamos.