Há pouco tempo voltou a Casa Grande de Romarigães a ser notícia devido ao futuro que lhe poderá estar reservado. É sabido que a casa foi herdada pela esposa de Aquilino Ribeiro, ou pelo casal, em consequência daquela ser neta de Miguel Dantas, o qual admitiu que a tenha licitado em alguma altura posterior ao seu regresso do Brasil.
Avalia-se a importância desta casa dita justamente como sendo um “ex-libris” do concelho, especialmente por ela constituir o cerne da obra literária do grande escritor beirão, que assim a imortalizou. O que resta da casa dá ainda mostras de boa traça, salientando-se a fachada que bem ilustra a paisagem envolvente e o exemplar barroco da capela. Imóvel do século XVII, ao que parece já classificado como imóvel de interesse público, a última manifestação de real interesse por parte da família terá sido mesmo a de Aquilino Ribeiro em meados do século passado.
Aquando da visita do seu filho também chamado Aquilino, e recentemente falecido em Lisboa, onde residia, visita essa a Paredes de Coura algum tempo depois do 25 de Abril de 1974, disse ele em desabafo à vista da casa: “Isto é um palheiro!”. Noutra altura, questionado sobre o que ali faria, afirmou, segundo consta de notícia, que a “Casa Grande de Romarigães é um património do país”.
Entretanto, talvez mesmo antes da década de 90, um professor da Escola Secundária, biólogo de formação, entusiasmou-se com uma deriva da profissão para se dedicar à exploração dos terrenos da casa e quinta para plantação de árvores e arbustos e a sua comercialização futura. Para cá se deslocou com a família vendo-se na necessidade de criar algumas condições de habitabilidade, o que fez na parte direita do edifício que restava.
Não apenas pelas razões apontadas, mas pela cultura portuguesa e minhota, a casa, ou o que resta dela, é importante. A propósito, ali funcionava a escola primária de Romarigães nas primeiras décadas do século XX, altura em que muito provavelmente em meios como o nosso, só haveria escolas masculinas – caso a estudar! Ali, cerca de 1913, acolheu a professora uma menina de Infesta que com ela passou a habitar a fim de frequentar as aulas. Porém, como a escola era masculina, ela tinha de ficar sentada numa cadeira ao lado, junto à parede, na parte anterior da sala. Isto é, com um estatuto diferente, quase como de observadora. Já agora vem a propósito que em 1936-39 uma rapariga da escola de Cerdeira-Cunha teve de fazer exame da quarta classe ao fim de três anos diferentemente do que era praxe para os rapazes, embora muitos se ficassem certamente apenas pela terceira classe. Adiante!
Certa vez que visitei a Casa Grande de Romarigães, num bonito dia de Verão, apercebi-me do que me pareceu serem excepcionais condições acústicas no terreno atrás da casa. É um facto que já tenho por vezes sofrido de sensibilidade auditiva, mas mesmo assim imagino o desempenho de um coro bem afinado naquele lugar. Seria a meu ver um acontecimento.
Mas a casa é uma ruina, não deixa de o ser. Donde já há tanto tempo que tinha vontade de oferecer os meus comentários na hipótese de poderem ter alguma utilidade. Normalmente pensamos na reabilitação ou restauro de um monumento tendo por base um projecto do tipo “exploração”, um programa visando a sua rentabilidade. Casos haverá em que bastaria serem consolidados, mostrando-se na “sua completa nudez e ostentando todas as suas marcas da passagem do tempo, sendo por isso visitados e amados”. Defende-se em todo o caso, como é reconhecido, a existência de um plano director.
E comentários? Vão eles no sentido de se apurar a reabilitação da ruina e dos muros de boa talha ali existentes. Manter-se-ia como um lugar de memória, de visita, de paragem e de desfrute paisagístico. O que fazer depois? A cultura do concelho irá certamente fazer o resto: um pequeno quiosque com os livros do autor, uma instalação sonora…
Não poderia terminar sem dizer que tenho encontrado poucos leitores de Aquilino e que o concelho não terá sobressaído nesse campo. Onde está o círculo de leitores de Aquilino?