Foi com muita apreensão que há dias assisti à tomada de posse de Jair Bolsonaro como Presidente do Brasil. Ficou-me na retina a expressão lapidar deixada: “Brasil acima de tudo e Deus acima de todos”. Embora crente, defendo que misturar religião com política resulta quase sempre numa substância tremendamente volátil. Os riscos de tudo terminar com enorme explosão são infinitamente grandes. Por cá, a história fala-nos de alguém que defendia como prioridades “Deus, Pátria e Família”. E todos sabemos como tudo terminou.
Brasil, Nação, Deus e ideologia estiveram entre as palavras mais usadas pelo novo Presidente brasileiro. É, indubitavelmente, algo que nos lembra discursos de personagens históricas de má memória e nenhum de nós quer – de certeza – que esta história se repita.
Mas, o que é certo é que no poder deste país está um homem que em 1999 se assumiu como favorável à tortura. Há pouco mais de dois anos, afirmou que não daria emprego a homens e mulheres com o mesmo salário. Um homem que, em 2003, disse a uma deputada do maior partido adversário: “Eu nunca a violaria. Você não merece!”. E assim de repente, ocorre-me uma expressão deixada por Mário Soares mas num outro contexto: “Por muito menos que isto foi morto o Rei D. Carlos”.
Acha chocante, caro leitor? É o que temos.
Mas há mais. Este homem, que na tomada de posse anunciou um aumento do salário mínimo, é o mesmo homem que defende o fuzilamento no Código Penal brasileiro. E é também um homofóbico assumido. “Seria incapaz de amar um filho homossexual. Prefiro que um filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí”, disse este Presidente em 2011.
Este é o Presidente do Brasil. O “senhor capitão” que, em carro antigo e de esferográfica de marca brasileira, tomou posse e está agora aos comandos da nação da “Ordem e Progresso”. Ordem? Haverá muita, certamente. Progresso? Não me parece que se avizinhe.
Jair Bolsonaro tem o perfil completo daquele que pode tornar-se um dos ditadores mais perigosos do século que atravessamos. Sabe ser persuasivo, enganar o povo e conquistou o poder numa altura em que a nação bateu no fundo. E isto, caro leitor, é um autêntico “dèjá vu” aqui na Europa. Uma pena que faça tão pouco eco do outro lado do Atlântico.
É bom que não só os Estados Unidos da América como todos os países europeus estejam de olho neste senhor. Palpita-me que não demorará muito até à subida de desagrado do povo brasileiro com este capitão. O mesmo que, demonstrando o seu “respeito” para com os não crentes, afirmou em 2017 que “não existe essa historinha de Estado laico”. “Vamos fazer o Brasil para as maiorias. As minorias têm que se curvar às maiorias. As minorias se adequam ou simplesmente desaparecem”. Sim. Isto são mais do que motivos para ter atenção. E medo. Porque para sempre ficaram as palavras sábias de Edmund Burke: “Para que o mal triunfe, basta que os bons não façam nada”.