1956.Apenas um ano de meados do século XX. Não mais do que isso na linha do tempo, embora possa ser considerado de modo diferente se o quisermos situar numa linha histórica de tanta coisa.
E se lermos este ano, como a qualquer outro, pelo “Notícias de Coura”?
A primeira constatação permitir-nos-á dizer que, na continuidade de outros jornais concelhios, o jornal começou a ser publicado a 30 de março, tendo como diretor o Dr. José Gomes Moreira, que o apresenta como sendo a alma do antigo “Courense”.
Uma outra evidência é a de que o jornal, visado pela censura política, demorou alguns números a entrar na ideologia do Estado Novo, de orientação fascista, visível, entre outros aspetos, no modo como realça o slogan conhecido de Deus, Pátria e Família.
A exaltação dos valores rurais, a confiança no sucesso de uma terra que gerava miséria, em que os proprietários dos campos de cereais eram rudes na exigência anual de uma renda altamente penalizante, como se os lavradores tivessem de cultivar diariamente a sua própria pobreza, a defesa de um quinhão de terra que era melhor do que África, Brasil, Lisboa, entre outros destinos da migração desses anos, os hinos tocados em louvor do regime político, sobretudo a um líder sentado na insensível cadeira de um poder longínquo, bem como à mocidade portuguesa, defensora de valores conservadores, enfim, a defesa da ideia peregrina de que tudo era belo e adorável numa terra que criava um profundo fosso, como se escrevia, entre todas as classes sociais, e que estas gostariam de Coura como de um jardim de rodas floridas em eternas primaveras.
Também dá para ver como surgiu a ideia de construir uma nova igreja, condenando à demolição a igreja que vinha de tempos mais antigos, paredes-meias com a vila, como se fossem dois amigos inseparáveis, e que hoje seria um ex-libris do concelho.
Sabe-se que essa ideia foi ganhando alma e que os courenses foram generosos, em trabalho e dinheiro, este angariado em cortejos e aquele suportado pelos mais valentes na preparação do terreno e transporte de pedra, com incentivos para que as pessoas da terra não se envergonhassem da velhinha igreja, isto é, dando a palavra ao narrador desse tempo:
“É com grande aprazimento que hoje damos a boa notícia de que vai construir-se uma nova igreja paroquial na vila e freguesia de Paredes de Coura, visto a atual se encontrar em verdadeiro estado de ruína. Esta notícia especialmente escrita para os ausentes daqui natos, temos por certo, que os vai fazer exultar de júbilo ao saberem que, de facto, o antigo templo, onde foram batizados e que em nada se recomenda pelas suas linhas arquitetónicas, será em breve demolido para se ostentar outro moderno e lindo, como se verifica no respetivo projeto, onde todos os atos do culto possam ser celebrados a bem-dispor os fiéis” (texto alterado para a nova ortografia).
PS: Um facto notório tem de ser mencionado: Tiago Brandão Rodrigues, “o nosso Tiago”, como a gente de Coura gosta de dizer, foi reconduzido como ministro da educação, sendo o primeiro a estar nessa situação, depois de ter completado uma legislatura completa, de quatro anos, com elevado mérito, e de ter sido eleito deputado, como cabeça de lista pelo Partido Socialista, pelo distrito de Viana do Castelo, cujas eleições ganhou, invertendo uma derrota que já era crónica. E como não acredito em coincidências, tenho de confessar que, há quatro anos, soube da notícia em Timor-Leste e que agora tive conhecimento dessa extrema proeza, no Dubai, a caminho da terra do sândalo.
Mas que as há, há.