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A AVENTURA DO MEU IRMÃO NUNO

25 de Maio de 2021 | Manuela Brandão
A AVENTURA DO MEU IRMÃO NUNO
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Partiram de Vitry Sur Seine, nos arredores de Paris, no dia 1 de Maio. Três amigos, portugueses emigrantes em França: Dinis Amorim, de 51 anos, natural dos Arcos de Valdevez; Miguel Antunes, de 45 anos, natural de Vila Verde e o Nuno Soares, de 40 anos natural do nosso concelho, mais propriamente da freguesia de Ferreira, e posso dizer com orgulho que partilhamos o mesmo ADN, pois é meu irmão.

A loucura está-lhe no sangue e o gosto pela aventura nasceu com ele. Desde muito novo desafiava as leis da lógica e recordo-me de uma infância rica em situações engraçadas, posso partilhar convosco que o Nuno aprendeu a andar de bicicleta num pequeno triciclo que nos foi oferecido por uns familiares que iam emigrar, um triciclo mesmo, daqueles com uma roda à frente e duas rodas atrás, esse triciclo tinha uma particularidade, faltava-lhe uma roda atrás fruto de algum acidente que sofrera, assim sendo era basicamente uma bicicleta (duas rodas) sendo que para manter o equilíbrio era preciso algum jeito e muita ginástica! Lá ia o Nuno todo inclinado em cima do triciclo a pedalar como se não houvesse amanhã, com um sorriso de orelha a orelha, característica que também sempre lhe foi reconhecida: o sorriso fácil.

Mais tarde veio a paixão pelas motos, e que paixão! Sempre com sede de adrenalina praticamente todos os dias o Nuno pegava na sua Yamaha DT e percorria aqueles montes de Ferreira, numa altura em que ainda não havia telemóveis a nossa mãe sabia onde o Nuno andava pelo som da moto no monte, claro que na maioria das vezes levava um raspanete ao chegar a casa mas nem isso o demovia da sua paixão.

Movido pelo espírito aventureiro desde sempre, mesmo emigrado em França, o Nuno vinha a Portugal várias vezes ao longo do ano para participar em diversas provas de motos tal como Coura TT e ArcosTT, entre outras. Fascinado que é por motos, e desafiado por amigos, em 2019 fez parte de um grupo que veio de Paris até Paredes de Coura em motos antigas, desafio terminado com sucesso e que os deixou com vontade de se superarem. De volta às suas rotinas em França os amigos sentiram que as aventuras juntos teriam de continuar, mas o que viria a seguir? Queriam algo que os pusesse à prova, uma aventura verdadeiramente épica… Durante um jantar de amigos coube ao Miguel, colega de trabalho do Nuno, lançar o repto: e se fizessem o percurso Paris-Portugal de bicicleta? O amigo Dinis aceitou de imediato, já o Nuno teve as suas reservas, problemas de coluna não lhe permitiriam fazer essa viagem, pensava ele na altura, mas prontificou-se a acompanhar os amigos nessa aventura dando a assistência necessária.

As ideias foram fluindo, inicialmente viriam de bicicleta, com as mochilas atrás, mas o senhor António Rodrigues (dono da empresa de reciclagem Luxo Bennes) amigo do Dinis e patrão do Nuno e do Miguel, sabendo da intenção dos amigos não teve dúvidas: se eles viessem de bicicleta o António e a esposa, Silvina Rodrigues, dariam o apoio necessário acompanhando-os com duas autocaravanas. Isso facilitava imenso toda a logística da viagem, era hora de planear tudo com mais rigor, a viagem começaria no dia 25 de Abril de 2020, e aí veio a pandemia… e tudo ficou adiado.

Entretanto os problemas de coluna do Nuno deram tréguas e como o apoio durante a viagem estava garantido ele resolveu que era hora de começar a treinar e acompanhar os seus amigos nessa aventura, foram alguns meses de treino mais rigoroso, e decidiram que a tão desejada viagem começaria no dia 1 de Maio, tinham percursos planeados, e a previsão seria chegarem a Paredes de Coura no dia 12 de Maio. Partiram então de Vitry Sur Seine no dia 1, acompanhados por duas autocaravanas, com destino a Portugal. Durante a viagem foram fazendo reportagens diárias que publicavam nas suas redes sociais, mantendo assim as pessoas informadas e aguçando o apetite para aqueles que pretendem fazer o mesmo.Todos os dias se levantavam por volta das 6horas, tomavam um pequeno-almoço rico em calorias, actualizavam as redes sociais com uma reportagem e percorriam o percurso planeado (percursos de 150 a 200km), durante o qual se alimentavam de barras energéticas, bananas e muita água, chegados ao destino tinham à sua espera um banho quente e as refeições preparadas pelos seus companheiros de aventura, o casal Rodrigues, que consistiam em massas, arroz e muita proteína. Depois de cinco dias a pedalar descansaram um dia, ao sétimo dia voltaram à estrada. A viagem foi decorrendo sem incidentes, apenas um furo e uma multa, pois o Nuno infringiu a lei, usando o telemóvel para tirar uma foto enquanto conduzia a bicicleta, sendo que o mais difícil foi mesmo as condições climatéricas, muitos ventos desfavoráveis e muito frio e chuva, pensavam eles que nesta época do ano o clima seria mais ameno, mas em determinadas zonas do percurso ainda tiveram temperaturas a rondar os zero graus. O apoio das famílias foi muito importante, e as mensagens de apoio nas redes sociais também lhes davam ânimo para quando as forças pareciam querer falhar, a cada quilómetro percorrido era um quilómetro mais perto das terras que os viram nascer. Durante a viagem os problemas deixaram de existir, as paisagens que se estendiam diante dos seus olhos, rios, montanhas, o mar, os campos, deixaram-nos deslumbrados, o espírito de equipa também prevaleceu sempre, acima de tudo ali eram todos companheiros com o mesmo objectivo.

Ao décimo segundo dia desta epopeia os ciclistas atravessaram a fronteira e chegaram ao nosso país, foi concerteza o dia mais emocionante da viagem, era a certeza do dever cumprido.Tinham-se passado 12 dias e tinham percorrido 1711 quilómetros de bicicleta. No dia seguinte fizeram um último percurso até Vila Verde de onde é natural o Miguel Antunes.

A quem se quiser aventurar numa experiência semelhante os conselhos destes homens são que treinem muito, 3 a 4 vezes por semana, fazendo percursos maiores pelo menos ao fim-de-semana para o corpo se habituar à posição na bicicleta, planear muito bem os trajectos e não esquecer que é necessário uma boa assistência, pois isso facilita muito.

Acima de tudo estes três mosqueteiros, como foram apelidados, sentem-se muito gratos às Câmaras Municipais que os acolheram: Câmara Municipal dos Arcos de Valdevez, Câmara Municipal de Paredes de Coura e Câmara Municipal de Vila Verde, à Efapel, à UCPB, Rúben Veloso, Bikevez Daniel Alves, à Rádio Alfa, Rádio Barca FM, AltoMinhoTV, às pessoas que os receberam e apoiaram durante a viagem nas redes sociais, ao casal Silvina e António Rodrigues que prestaram assistência durante toda a viagem e às suas famílias que foram essenciais e sempre os apoiaram nesta loucura.

Resta-me agradecer ao Dinis, ao Miguel e ao meu irmão por terem tido a coragem de viver esta aventura e nos terem permitido que vos acompanhássemos, vivendo assim também um pouco daquilo que vocês vivenciaram. Por fim acredito que já existirá aí uma outra aventura a ser cozinhada e ainda ouviremos falar novamente de um grupo de emigrantes que se fizeram à estrada para regressar à sua terra numa aventura sem igual!

   

 

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