Escrevo esta crónica na semana em que se comemora, de Azinhaga, em terras do Ribatejo, até aos mais longínquos lugares, o primeiro centenário do nascimento de José Saramago, que engrandeceu a literatura pela contundência de palavras escritas a partir de um mundo perante a desumanização da condição humana.
Ler, por exemplo, “As pequenas memórias,” evocativas da imagem do seu avô e colocar os alunos do ensino básico a evocar personagens que lhes são familiares é uma das formas de valorização dos seus textos, pois a escrita de Saramago brota do povo e ao povo pertence, na sua totalidade, como se observa no “Memorial do Convento,” onde o rei é menos poderoso que o povo e Blimunda a personagem que enche o livro e nos faz ver que o poder é transitório, por mais que seja moldado por reis, rainhas, príncipes ou presidentes.
Um presidente acaba de tombar do seu pedestal, erigido a partir de notícias falsas e teorias da conspiração, como se fosse possível a irresponsabilidade política tomar conta do governo de um país.
Sentimos, como nunca, as eleições presidenciais no Brasil e a vitória de Lula da Silva, saído da profundeza do povo que o elegeu, sobretudo do povo nordestino. Foi um momento de alívio, podendo-se respirar de forma mais livre e colocando-se em causa os três poderes – da bala, da bíblia e do boi, simbolizando, respetivamente, militares, evangélicos e latifundiários – que manietaram esse senhor que ainda não aprendeu a perder, como se em eleições apenas se pudesse ganhar.
Porém, há um outro senhor, nos Estados Unidos, que não aceita o jogo das eleições com perdedores, porque apenas ele e os seus candidatos podem vencer. O que os eleitores norte-americanos expressaram é que não há uma onda vermelha ou republicana a afundar a onda azul ou democrata.
Apesar da subida desastrosa e impopular da inflação, Biden aguentou-se, tremeu mas não caiu e aí está para evitar que o mundo navegue no caos, construído pelos mundos paralelos em que certos pessoas insistem em viver, como se os outros, contrários aos seus credos políticos, não fossem pessoas e não tivessem direito a votar pelo respeito à diferença e à democracia.
Num mundo real e próximo, cheio de afetos, vive o professor Manuel da Silva Pereira, autor da monografia “A freguesia de São Pedro de Formariz. Identidade, património e memórias.” No minucioso e historicamente fidedigno texto, escrito com o coração aberto à sua comunidade de pertença, o autor relembra Saramago quando “disse um dia que os seus analfabetos eram, todavia, as pessoas mais sábias que conheceu.”
Assim se faz uma monografia, com dedicação, conhecimento e afetos, podendo este livro servir de exemplo para outras s monografias de que o concelho está à espera.