Depois de uma viagenzita a Santiago de Compostela – e quem me dera que tivesse feito o caminho mais uma vez! –, de ir num dia e regressar no seguinte, fiz a transatlântica viagem para o Rio de Janeiro.
Se a cidade foi descoberta a 1 de janeiro, após navegar pela primeira vez, na Baía de Guanabara, naus quinhentistas ou das descobertas (sendo mais adequado dizer achamento, pois os povos indígenas já lá estavam, como bem diz Pêro de Vaz de Caminha, na carta que enviou ao rei), cada viagem significa algo de novo que se encontra, e que faz desta cidade um lugar privilegiado ao nível da natureza.
Fiquei hospedado, como sempre, na Avenida Atlântica, em Copacabana, mas não no posto 5, próximo do forte, já que a reserva tinha sido feita para o Leme, no posto 1.
Dali, do 19º andar, via por inteiro Copacabana, abençoada pelas montanhas entrelaçadas por arranha-céus, por edifícios de muito andares, por prédios mais pequenos ou por casas desenhadas no interior dos morros, localizadas nas comunidades (ou nas favelas, como não se deve dizer).
Cada vez que respirava enchia os pulmões de Rio, captando o seu poder intimista, bem como a sua magia esvoaçante, fazendo de cada transeunte um ser especial. Sentia-me em casa, como se Coura ali estivesse.
Não é por acaso que, após muitos anos de escrita vagabunda, intermitente e cadenciada pelos momentos eternos de recordação, e após ter escavado longínquas memórias da minha família, encerrei um texto sobre o meu avô, com o nome de José Joaquim Pacheco, a publicar em tempos próximos.
Podê-lo-ia ter feito noutros lugares, por exemplo em Santa, mas tinha de o fazer no Rio, e essa situação era por mim desconhecida.
Por isso, dediquei um sábado, sem sol e com um friozinho vento soprando nas janelas abertas da esplanada do hotel, à revisão do texto e à moldagem dos seus últimos encaixes, já que as imagens familiares que conservamos de forma indelével sobre a nossa família são como um lego de muitas peças, acrescido de muitas dificuldades.
Também tomei outra decisão. Quando iniciei o livro, em fevereiro de 2012, em Maputo, aproveitando as manhãs livres para escrever no jardim dos professores, tinha decidido que usaria no título o nome de uma flor muito comum de uma árvore tropical.
Apesar de ter motivos tropicais, ligados à emigração que intersetou a minha família de uma geração atrás, o livro terá por título “Monte D’Além”, no qual muitos leitores se reconhecerão, principalmente os de Ferreira.
E sobre o Rio de Janeiro, assim foi, conferindo-me uma tranquilidade que eu ainda não tinha em relação a um avó que eu não conheci pessoalmente, e de quem pouco ou nada sabia.