No dia 6 de agosto de 1903 deu à estampa o nº 1 de A VOZ DE COURA, sendo administrador Eduardo Pereira Bacelar, redator Gaspar José Rodrigues Barbosa e editor Serpahim José Rodrigues Barbosa, e estando a redação e administração localizadas no lugar das Corredouras, mais concretamente na “Venda das Corredouras”.
Do “Nosso Programa” é dito que “o nosso jornal que será semanal limita-se a ser recreativo, noticioso e instructivo”, sem partido político, pugnando pelos interesses locais, afirmando estar do lado dos “católicos práticos e verdadeiros crentes” e dos “patriotas genuínos” e adotando por lema “Deus, Pátria e Povo”, para além da declaração de que são “monarchistas”, em defesa das “instituições vigentes do paiz, mas não nos calaremos, nem por sombras, deante de leis iníquas que venham flagelar e torturar este povo, já tão cheio de desgostos e misérias, cambaleando já, vergado ao pezo de tantos impostos e vexames”.
“Da nossa Carteira” ficamos a saber quem está onde (sobretudo nas estâncias termais), quem regressou de férias ao concelho, quem foi visto no mercado e quem viajou para mais longe, por exemplo, “Partiu para o Rio de Janeiro, acompanhado da sua esposa, o sr. Conselheiro Miguel Dantas, par do Reino. Que tenha uma viagem feliz e que brevemente regresse à sua terra natal, são os nossos mais ardentes desejos.”
Pode-se ler o início do folhetim “Em Peccado Mortal (Episódio da Aldeia) e ficar a saber quem foi aprovado nos exames do primeiro grau, quem requereu exame do segundo grau, por que razão a festa de “N. S. da Penna” foi adiada (“luto da família dos extinctos visconde e viscondessa de Mózellos”), quem faleceu, e das seis pessoas o texto é pródigo no relato do decesso de uma “viúva, proprietária e capitalista, deixando uma fortuna calculada em sessenta contos de reis”, bem como os cemitérios que começaram a ser construídos (os de Bico e de Resende), quais os preços praticados no “mercado quinzenal, realisado m’esta Villa, em 25 de julho findo” (milho branco, milho amarelo, trigo, feijão branco, feijão rajado, batatas, ovos e galinhas), que estampilhas fiscais devem ser usadas e qual o conteúdo de dois pequenos episódios moralizantes sobre pessoas de outros tempos. Há também referência às festividades religiosas de Castanheira (mártir S. Sebastião), de Insalde (Nossa Senhora da Conceição) de Padornelo ( Senhor Ecce Homo), de Bico (Nossa Senhora das Dores) e de Formariz (Nossa Senhora do Livramento), onde “o fogo [do ar] não produziu o efeito que se esperavam devido ao máo tempo.”
Ah, ainda poderão ser consultados os números relativos aos prémios da “Loteria de Lisboa” e se o/a leitor/a deste texto tiver tempo, e também disponibilidade, já que as exceções do atual confinamento o permitem, pode comprar na “Pharmacia” de Justino Ribas, em Paredes de Coura, “drogas, productos chimicos e farmaceuticos, medicamentos nacionaes e estrangeiros, fundas, algalias, mamadeiras, suspensórios, irrigadores de vidro e zinco, thermometros clínicos, lembrando-se, ainda, que “n’esta farmácia aviam-se receitas a qualquer hora da noite.”
São apenas quatro páginas, mas que riqueza elas contêm para a reconstrução do quotidiano deste concelho!