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23 de Novembro de 2021 | José Augusto Pacheco
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Opinião

No meu percurso de estudante, tive a Português, no curso geral dos liceus, mais precisamente do 3º ao 5º anos, se me permitem que ainda use essa terminologia escolar, um professor-padre-escritor, chamado João Gomes Gonçalves, literariamente conhecido pelo pseudónimo Joãozinho Lã-Branca.

Com este nome escreveu, no espaço de três anos, “Cartas de Ternura, Pilhéria e Saudade,” “O Verde e o Vermelho,” o último também declarado “romance para maiores.”

Li, decerto, os três livros enquanto fui seu aluno, lembrando-me das suas aulas, animadas por uma densa utilização de adjetivos, enchendo as frases de muitos sentidos, em sequências breves, mas profundas, acompanhados de ideias recriminativas da nova sociedade que despertava.

Tive a sorte de ter um professor com método e dotado de ideias, promovendo a personalização do aluno e dando asas a uma escrita criativa, em que o uso do dicionário era obrigatório, em busca de outra roupagem para aquilo que comummente se diz, de modo simples, como ar que se respira.

Li o dito “romance para maiores” em tempos que ainda não tinha a maioridade, pelo que muitas das suas marcantes imagens e ideias se perderam pelo caminho. Por estes dias, na escrita de um outro texto, precisei de reler esse livro e procurei-o online, já que o exemplar comprado, em escudos, desaparecera, possivelmente por ter sido emprestado a alguém mais próximo.

Não precisei de fazer a sua encomenda. Apenas estava disponível num alfarrabista de Braga.

E lá fui. Habitava as estantes vestidas de muita velhice. Comprei-o. Paguei, mas agora em euros, olhando com satisfação para a capa que tão bem conhecia, como se o filho pródigo estivesse de regresso a casa.

Quando o recebi, ávido, sossegado, reparei que tinha uma ficha de catalogado, na qual constava o autor e um número. 555. Sim, três cincos.

Tudo normal?

Talvez!

Por que não?

Porque havia ali uma grande coincidência. Recomprei o livro, escrito por um professor meu, o de Português, que na altura lecionava no Instituto Missionário Espírito Santo, em Fraião, Braga. E nessa altura eu usava roupa identificada, ocultamente, pelo mesmo número que serviu de catalogação ao alfarrabista.

Peguei, enigmático, no livro, desci a rua dos Chãos e fui à “Brasileira”, um café centenário do coração de Braga.

A pessoa amiga que procurava, da Universidade da Madeira, estava reunida, sem eu o saber, com outra pessoa, que conheço tão bem: o amigo Doutor Carlos Subtil, acompanhado da sua esposa e do seu irmão, também académico.

Falei-lhes da coincidência.

No final, o Doutor José Subtil disse-me que também ele andara no mesmo Instituto, no qual não nos cruzámos.

E mais falámos.

 

 

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