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5 de Abril de 2022 | José Augusto Pacheco
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Opinião

Para quem não esteve em cenários de guerra – e como a nossa geração pensou, infantilmente, que jamais a teria tão próxima! –, a televisão coloca-a dentro das nossas casas e nas redes sociais.

Muitos portugueses viveram-na em África, na guerra colonial do Estado Novo, que tantos saudosistas ainda inspira, sem pensarem que o nacionalismo é uma das condições reais para a existência da atual guerra da Ucrânia ou, melhor dizendo, da invasão cruel e estúpida da Ucrânia pela Rússia.

Reli, por estes dias, Theodor W. Adorno, pensador alemão que sentiu o quão de desumano pode ser uma guerra, como aquela que foi desencadeada pelo nazismo, na II Guerra Mundial.

Tendo-se refugiado no estrangeiro ainda antes do estalar da guerra, e uma vez voltado à Alemanha, o filósofo não se cansou de chamar a atenção para os perigos do regresso da barbárie, que aconteceu em Auschwitz, e que personifica toda e qualquer forma de brutalidade desumana, de fúria agressiva incontrolada, de selvajaria pura e descontrolada.

Proclamou, ainda, a necessidade de olhar para as pessoas e para as condições sociais que geram a desumanidade, não sendo possível dizer que os que mais sofrem (ontem, os judeus, hoje, os ucranianos) os horrores de uma guerra são os verdadeiros culpados e que o castigo é mais que justo.

Esta retórica de culpabilização dos outros, numa clara divisão entre nós e eles, é muito perigosa como princípio social e como forma de justificar o totalitarismo, cuja legitimação provém da propaganda, essa tal forma de manipulação racional do irracional.

Não há duvidas de que a barbárie é gerada na sociedade e que só a ausência de uma sociedade democrática, de pessoas conscientes e interventivas, a torna possível através da agressividade, do ódio e do impulso de destruição, o que faz com que tantas pessoas vivam em condições humanas indignas, como as que surgem naquelas imagens a que agora assistimos, com uma dor profunda de alma, como se essas pessoas fizessem parte de nós.

O que mais me impressiona nesta guerra, para além do terror gratuito, estúpido, desumano, é a deslocação em massa de crianças para fora da Ucrânia, como se o futuro no seu país não lhes pertencesse.

Diz-se que metade dessas crianças já saiu do país, sendo altamente provável que uma percentagem significativa não regresse. E um país sem crianças é um país sem futuro. Mas é isso o que a Rússia pretende: tornar as comunidades russas na Ucrânia ainda mais fortes, para que um dia esse imenso território fértil na produção de cereais faça parte do império da revolução de outubro de 1917, já tanto adulterada por Lenine, Estaline e Putin.

E não se repetindo, a história ensina-nos que há fatores de continuidade que persistem, por exemplo, o da ganância humana. Também Hitler, com medo de que a Alemanha não tivesse os alimentos suficientes, invadiu a Polónia e a Ucrânia, dizimando populações e semeando o terror.

 

 

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