Foi no dia 27 de Novembro que pude assistir a um espectáculo que me despertou um furacão de emoções. Não só por se tratar de uma artista enigmática e carismática, mas também por ela procurar provocar, no seu público, uma sensação de proximidade. Senti que a conhecia, através da sua energia intimista e do seu reportório fugaz. Rosalia, cantora e compositora catalã de 30 anos, trouxe para esta apresentação uma viagem de moto. Uma apresentação que, recorrendo a poucos adereços, captou a minha atenção desde o primeiro segundo.
Mesmo após ter estado 4 horas à espera desta autêntica demonstração do que é ser um artista, admito que o espectáculo compensou a dor de costas e pernas com que acordei no dia seguinte. Neste dia, pude não só conhecer Rosalia e toda a magia que consegue trazer para o seu concerto, mas também fãs que partilharam as suas histórias. Histórias como a de Elsa, uma fã catalã que veio propositadamente a Lisboa, para possibilitar à sua mãe a experiência que tivera meses antes. Duas mulheres provenientes de uma zona perto de Barcelona, que foram a nossa companhia durante todo o concerto. Uma excelente companhia que nos elucidou acerca de curiosidades tanto sobre a jovem cantora como sobre a sua obra. Elsa já tinha tido a oportunidade de ver a sua “ídola” em Barcelona, mas os bilhetes esgotaram em minutos e por não ter tido a oportunidade de levar a sua mãe ofereceu-lhe como prenda de aniversário o bilhete para o concerto, a viagem e a estadia naquela Lisboa. E é aqui que encontramos a confirmação de que a cantora é ouvida e adorada por várias faixas etárias. E tal como a artista afirma, o que mais a encanta é saber que consegue alcançar várias pessoas e que quando olha para o seu público consegue ver desde jovens a graúdos a vibrarem com ela, algo que lhe enche o coração.
O concerto foi surreal, uma experiência que já não me lembrava de viver há muito tempo. Músicas profundas e com ritmos turbulentos, passagens de sons mais calmos para outros mais mexidos e explosivos, a versatilidade de instrumentos que foram tocados em palco pela artista, a sua voz melodiosa e a sua performance em conjunto com a dos seus bailarinos foram os pontos chaves para tornarem aquelas duas horas numa viagem tão completa e fácil de assistir. Mas este espectáculo, não serviu só para poder verificar o quão talentosa a cantora é, mas também todo o carinho que sente pelos seus fãs. Este fator ampliou a admiração que tenho por ela, ao mostrar que pertence ao seu público e que tenta, com tudo o que tem ao seu alcance, tornar a experiência única para cada um. Presenciei de perto esse esforço, e por isso reconheço-o desde a subida de fãs ao palco, a conversas com a plateia durante o concerto, a leitura e concretização daquilo que estava escrito em alguns cartazes e a própria descida do palco para abraçar, cantar e agradecer aos fãs por estarem ali com ela. São essas atitudes que diferem um artista daqueles que só têm talento. Nessa noite, Rosalia expôs momentos pelos quais passou quando escreveu algumas músicas, como por exemplo momentos de solidão. Muitas vezes esquecemo-nos que os nossos ídolos também são seres humanos e têm direito a sentir aquilo que nós sentimos. Não estão privados de sentir medo, desamparo, tristeza e a ter fragilidades e receios, simplesmente muitas vezes usam esse sofrimento a favor deles. Visto que tal como a felicidade também a tristeza pode inspirar.
Foi o terceiro concerto dado em Portugal e o primeiro em Lisboa. E teve que ser com a apresentação do seu mais recente álbum intitulado de “Motomami”, bem como alguns êxitos do passado. “Motomami” é um nome que, tal como o “Moto Moto” do filme “O Madagascar”, é uma representação de admiração pela sua beleza. Um álbum onde todas as letras foram produzidas pela cantora. Rosalia só pode ter bebido água benta jorrada de uma fonte de inspiração, porque este conjunto de canções está de ouvir e a chorar por mais. Onde as músicas são como pequenos pedacinhos que revelam traços da artista, e ao mesmo tempo nos contagiam e nos fazem sentir o que ela própria sente ou sentiu.
Reservei este parágrafo para falar um pouco sobre Rosalia Vila Tobella, para que tal como eu, consigam entender quem está por trás da grande Rosalia. Apaixonou-se pelas artes muito cedo, iniciou a sua formação profissional com apenas 16 anos e sempre mostrou ser uma excelente aluna. O amor que sentia pelas artes tornara-a num sucesso acadêmico. Após finalizar a sua formação trabalhou como cantora independente em casamentos e bares de música ao vivo, recebendo “pouco mais de 80 euros ou trocando o trabalho por jantar”, conforme afirmou a própria. Vivenciou experiências únicas e que de certa forma ajudaram a artista a definir-se como cantora. Uma jovem que usa o flamenco como base para os seus temas, tornando-o renovado e moderno, podendo ser consumido por todo o mundo. Quem já teve oportunidade de ouvir o seu mais recente álbum e dominado pela curiosidade, pesquisou sobre a origem de algumas músicas e ficou, com certeza, fascinado com as inspirações. A título de exemplo, as músicas “Saoko”, que serviu de homenagem ao “Reggaeton” mais clássico, e a música “Bizcochito”, que pretende responder à música “Saoco de Daddy Yankee e Wisin”. O clássico inclui os versos “Quem é você? Seu bizcochito”, interpretada como a transformação da mulher em objecto de desejo e prazer masculino. Deste modo a cantora no seu tema começa com “eu não sou e não vou ser o seu bolo”, clarificando a sua posição sobre essa definição. A verdade é que Rosalia conquistou o mundo e Portugal não foi excepção, por esse motivo conseguiu esgotar tanto em Lisboa como em Braga.
Apesar das datas terem passado, aconselho vivamente a se tiverem a oportunidade de assistirem a uma apresentação desta artista, que o façam, garanto-vos que não se vão arrepender. Eu própria pretendo repetir a dose de vitamina R de Rosalia.