Uma das palavras portuguesas mais emblemáticas é, sem dúvida, a Saudade. Sobretudo porque este termo traduz-se num sentimento de profunda nostalgia, ausência e anseio por algo ou alguém. Contudo, o seu poder não se esgota no seu significado, mas também reside no facto de não possuir uma tradução directa em diversas línguas. Tornando-a, deste modo, única e culturalmente significativa. A junção destes dois motivos torna-a numa característica da alma lusófona, muitas vezes descrita como melancólica, mas repleta de emoção. São seis letras, que juntas, carregam o peso e a memória, da distância e esperança do reencontro. Uma expressão evidentemente enraizada no nosso espírito, nas nossas histórias de viagens, despedidas e até mesmo nos reencontros.
Mas como descrever a Saudade? Mais do que uma simples palavra, para mim, trata-se de um sentimento que surge nos meus momentos de reflexão, quando a minha mente se acalma e me deixo levar por aquilo que o meu coração tem para dizer. Uma espécie de brisa repleta de imagens, sons e sensações, que de alguma forma, me marcaram e que agora vivem na minha memória.
Nos últimos tempos a sua presença no meu quotidiano tem vindo a crescer. Tenho sentido o peso da ausência de várias formas e por diversos motivos. Seja pela distância da família, por momentos do passado que ficaram para trás ou pela falta de amigos com quem já não partilho o dia-a-dia. É curioso como mesmo rodeada de outras pessoas e ocupada com outros assuntos, digamos que distraída, existem momentos em que a saudade se impõe acompanhada de um misto de melancolia e carinho. Somos seres sociais e a saudade é a prova disso. Recordar gargalhadas, conversas, abraços, mesmo os silêncios confortáveis e partilhados, são momentos agridoces que me preenchem, mas que eu preciso para me sentir em harmonia.
Um dos principais gatilhos deste sentimento tem sido viajar. Sair da rotina e desconcertar um pouco os nossos hábitos, conhecer novos lugares e abrir os nossos horizontes através do contacto com outras culturas. Situações que podem desencadear a memória daquilo a que estamos habituados ou acostumados. Há sempre uma parte de mim, que ao embarcar nestas novas aventuras, anseia pela saudade daquilo que não parte comigo. Das caras familiares, o conforto do meu cantinho, da segurança da minha rotina, entre outras coisas. É como se cada nova experiência viesse acompanhada de uma saudade latente do que é, para mim, familiar. O mesmo acontece quando vejo amigos a mudarem-se, a seguirem os seus próprios caminhos, inevitavelmente sinto uma espécie de vazio, como se algo de importante estivesse a afastar-se de mim. Esse afastamento físico, por mais que seja natural e parte da vida, não deixa de trazer consigo uma sensação de perda e renovação. Apoio as decisões de mudança de todos os que vão em prol de uma nova conquista, sobretudo daqueles que de alguma forma desempenham um papel importante na minha vida. Por outro lado, fica a falta de poder abraçar, encarar pessoalmente, vivenciar em duo os “silêncios confortáveis”, aqueles em que a culpa não entra e a mensagem passa, confesso que isto me causa um certo transtorno. São nos momentos de falta que a saudade nos dá ares da sua graça.
É nas pausas tranquilas, longe da agitação, que surge o espaço para o meu coração sentir o que, na correria do dia, fica muitas vezes abafado. O tempo para, e as lembranças vêm à tona e pedem gentilmente a minha atenção. Ao ponto de até as próprias rotinas banais me fazerem falta. É quando me apercebo da importância que essas pessoas e experiências têm na minha vida. A Saudade também pode ser considerada como um lembrete do valor daquilo que temos ou já tivemos ao nosso redor.
A falta que as pessoas me fazem não significa que sinta mais saudade das pessoas que mais gosto, simplesmente assenta naquelas que têm uma presença mais forte na minha vida, encontra-se mais ligada a frequência com que interagimos e ao vínculo que temos. Existem pessoas que, mesmo estando longe, não deixam de ser parte fundamental da minha vida, e a sua ausência física não diminui o seu valor. Outras, com quem partilho momentos mais esporádicos, também têm um lugar especial, mas a saudade que sinto delas pode manifestar-se de forma diferente, mais suave, menos constante.
Gosto de pensar que a saudade é uma espécie de termómetro emocional, um sinal de que estamos vivos, de que sentimos e de que nos importamos. Pode ser doloroso e trazer-nos as lágrimas aos olhos, mas é louvável a beleza do motivo que nos levou a esse estado. É o reflexo de que vivemos experiências valiosas, de que amamos e fomos amados, de que as relações que construímos têm um peso real na nossa vida. E, no final, essa mistura de dor e gratidão é o que nos faz humanos. A saudade é, sem dúvida, uma companheira constante, uma recordação de que a vida é feita de momentos, pessoas e lugares que, mesmo quando não estão fisicamente presentes, nunca deixam de nos acompanhar.