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“Next Generation EU”, a saga continua

23 de Fevereiro de 2022 | Helena Ramos Fernandes
“Next Generation EU”, a saga continua
Opinião

Abriu-se mais um portão para a agricultura praticada em zonas vulneráveis. Zonas assim denominadas pela perigosidade de incêndio florestal e que se encontram identificadas na Portaria 301/2020. No nosso concelho, caro leitor, e principalmente pelo empenho da Câmara Municipal, quase todas as freguesias foram consideradas, com excepção de Rubiães e Castanheira. Freguesias que ficaram de fora, mas, como me disse um passarinho, expressão muito utilizada pela minha mãe, tudo foi feito para que estas freguesias também constassem do bendito mapa da já referida portaria. No entanto, estas também são elegíveis, apenas sofrem uma redução na pontuação e na percentagem de financiamento.

São 15 milhões de euros vindos directamente do envelope da Bazuca para as explorações agrícolas que se apresentarem a concurso até 1 de Abril de 2022. Parece mentira, mas não o é. E parece muito dinheiro, mas também não o é, caro leitor.

Para mim, tendo em conta o aliciamento que este anzol em forma de anúncio vai provocar a nível nacional, estes 15 milhões de euros não vão ser suficientes. Não se iluda, caro agricultor, quando tentar ir a esta fonte beber. Talvez esse néctar não chegue à sua boca, e o valor que irá antecipar por ele não se justifique.

Por isso, caros agricultores, o que se abriu foi apenas um portão e não a porta com passagem directa a este apoio. Alguns obstáculos terão que ser ultrapassados ou eliminados à partida. E para passar essa bendita porta, deverá envergar o “Dress Code” exigido no anúncio. Resumindo, o que realmente importa nesta fase de decisão, é estarem todos devidamente elucidados e informados. E que fiquem com a clara noção que só os projectos com boa pontuação (VGO) é que vão ser aprovados.

Olhando para um passado não longínquo, relacionado com o “Next Generation EU”, associado à renovação do parque de máquinas agrícolas em Portugal, arrisco-me a dizer que este novo anúncio vai padecer do mesmo problema. O propósito, os objectivos, ou as metas para este último não foram nem bem planeadas, nem bem dimensionadas. Talvez pela falta de noção da anterior ministra da Agricultura.

Recordemos, caro leitor, que o designado “Next Generation EU” é o instrumento de recuperação europeu de cerca de 750 mil milhões de euros. E advém do quadro financeiro plurianual acordado pelos Estados Membros do Conselho Europeu para o período de 2021 a 2027. E que foram atribuídos a Portugal cerca de 45 mil milhões de Euros desse rechonchudo número. E que este dinheiro só pode ser utilizado para propósitos pré-definidos. E, que a meu ver, abrangesse se não a totalidade, a maioria dos destinatários possíveis. E, caros governantes, se as regras à partida fossem mais claras e objectivas, facilmente retrairia quem não tem o perfil para lá chegar.

Voltando ao “Next Generation EU”, associado à renovação do parque de máquinas agrícolas em Portugal, isto é, aquele que foi lançado para que se substituíssem os tractores antigos, pouco seguros e mais poluentes, por outros mais seguros e mais amigos do ambiente, a afluência a este apoio foi muito elevada. E foi muito maior do que o orçamento previsto para ele, inicialmente de 15 milhões de euros (como acontece para este anúncio) mas que rapidamente aumentou para 35 milhões de euros. Mas infelizmente, e a meu ver por falta de visão coerente, este aumento não foi suficiente. Não se encontrando o processo completamente fechado, e com contas fáceis de fazer, mais de 80% poderão ficar de fora. No entanto, caro agricultor candidato, esperemos que quem venha ocupar a pasta da agricultura consiga perceber o mal que esta ilusão provoca a quem precisa deste apoio. E que este tenha a decência de aumentar a verba atribuída a este anúncio, e transformá-lo num sucesso, e não na vergonha do PDR2020.

Voltando à questão dos tractores, de referir, caros leitores, que em Paredes de Coura, os números foram bem diferentes. Das candidaturas apresentadas e submetidas neste concelho foram aprovadas mais de 80%, ao contrário do que aconteceu à escala nacional. O esclarecimento das condições de aprovações foi preponderante para este sucesso, e ao mesmo tempo retraiu alguns proponentes, não tendo estes gasto dinheiro em vão na elaboração das candidaturas a priori reprovadas.

Voltando ao assunto que me levou a escrever nesta edição, estão actualmente abertas, no PDR2020, candidaturas para os pequenos investimentos na exploração agrícola. Esta medida abrange investimentos, desde que elegíveis, superiores a 1000 euros e inferiores ou iguais a 50000 euros. Os apoios podem atingir os 70% do valor investido e de forma não reembolsável. Isto é, e a título de exemplo, se pretender investir 10000 euros num melhoramento fundiário, numa alfaia, no aproveitamento de uma reserva de água ou na plantação de uma cultura permanente, desde de que elegível, poderá receber de apoio não reembolsável 7000 euros, ficando apenas com o custo, para esse investimento, de 3000 euros. Uma ajuda bem aliciante, e que acontece numa altura que se avizinhe difícil para a agricultura, mas não só.

Não querendo ser futurologista, espero sinceramente que esta verba seja reforçada, caso contrário iremos testemunhar mais uma vergonha para o PDR2020.

Não se iluda, caro agricultor. O que realmente importa, para conseguir este bendito apoio, não é nem a sua ideia nem a sua boa intenção, o importante é saber se reúne as condições para obter uma boa pontuação (VGO), para não dizer excelente. O tal “Dress Code” que referi num parágrafo anterior. E quando se dirigir a um consultor, questione-o sobre essa tal de VGO, porque esta é, à partida, fácil de contabilizar. Os critérios de pontuação estão bem explícitos, e estão todos bem definidos. No anúncio associado aos tractores, o facto de optar por um tractor com cabine, a idade do tractor a abater, e o agricultor deter o estatuto de agricultura familiar, é que absorveu a maioria da verba. Neste anúncio, será com certeza, todos os que estiverem certificados para a Agricultura Biológica ou Produção Integrada, ou inscritos no IGP. Por isso, caro agricultor, se não envergar uma destas vestes, pense duas vezes antes de avançar.

No entanto, é verdade, que por vezes, quem não arrisca não petisca. Por isso, caro agricultor, pode e deve arriscar, se assim o entender, mas faça-o de forma consciente e com toda a informação do seu lado. E, se possível, não alimente a saga da vergonha do PDR2020, provocada por alguns dos apoios mal dimensionados do “Next generation EU”.

 

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