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8 de Novembro de 2022 | José Augusto Pacheco
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Opinião

Decorrendo ao longo de seis meses, e promovido pelo Centro de Estudos Mário Cláudio, foi inaugurado a 29 de outubro de 2020, o ciclo “A Guerra em África,” com destaque para a exposição de artefactos e fotografias de militares de Paredes de Coura, muitos deles presentes, rodeados de familiares e de muitos amigos.

Foi um evento intimista, daqueles que nos tocam não pelo conhecimento que temos das pessoas, mas pelo seu envolvimento patriótico, não querendo dizer que considero a guerra colonial ou ultramarina uma decisão justa do Estado Novo, que nos fez crer na imensidão do pequeno Portugal, como se Cabo Verde, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, S. Tomé e Príncipe, Timor-Leste e Macau fossem, para sempre, territórios portugueses.

A lição da independência do Brasil, em 1822, não fora ainda aprendida, como se aprendeu, no regime democrático de abril de 1974, a lição de Macau, cuja independência negociada foi consumada, em 1999, mantendo-se, até 2049, determinadas especificidades portuguesas, por exemplo, matrículas de carros e nomes de ruas e avenidas.

Perante a guerra dos “Turras,” Portugal exauriu os seus recursos e afundou ainda mais o seu desenvolvimento económico, como se fosse possível ficarmos “orgulhosamente sós,” no teatro das nações que exigiam a descolonização.

Por vários motivos, a guerra colonial portuguesa tem muitos tabus, sobretudo daqueles que combateram e por lá deixaram memórias adolescentes, corpos destroçados e amores perdidos.

Como evento humano, a guerra tem os seus segredos, alguns desvendados e a maioria soterrados na intimidade de muita gente.

A exposição inicial desse ciclo, promovido pelo escritor Mário Cláudio, foi um momento de desocultação, quer pelos pertences pessoais de soldados courenses, andados por terras de Angola, Moçambique e Guiné-Bissau, com destaque para fotografias, quer pelos aerogramas das madrinhas de guerra e demais cartas de amor e de dor, que tão sabiamente a escritora Marta Martins Silva recolheu no recanto de muitos enganos e desenganos.

Ouvir alguns desses textos, numa sala repleta de pessoas, atentas e ávidas de conforto, é ficar de alma dormente, sentindo, em carne e osso, o que tanto sofreram.

Por mais tabus que existam em torno desta hedionda guerra, é preciso falar dela, ver as imagens, ler os textos pessoais, vestir as fardas, sentir o silêncio aterrador das armas, escutar as vozes de apoio e protesto e olhar para a exposição como um facto histórico, com o qual temos de aprender, por mais duro que seja recordá-lo.

 

 

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