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21 de Novembro de 2023 | José Augusto Pacheco
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Opinião

É algo que não deveria acontecer em nenhum lugar, por mais que as pessoas digam que são sensíveis às mudanças climáticas em curso, e que também já mudaram os seus comportamentos.

No caso de Portugal, a realidade está à vista: tendência de seca no sul e fenómenos climatéricos mais violentos por todo o território, como é o caso das últimas tempestades, com mais incidência, porém, nas zonas norte e centro.

Em Timor-Leste, e mais particularmente em Díli, que absorve a maioria da população, os efeitos dessas mudanças também se observam, nomeadamente calor excessivo e ausência prolongada de chuva (que cai em abundância no interior montanhoso da ilha).

Por isso, quando aqui estou, tenho de adaptar-me, transferindo a caminhada quase diária para as sete da manhã, regressando uma hora depois bastante fustigado pelos impiedosos raios solares.

Por regra (e como os hábitos, por mais conservadores que sejam, nos fazem sentir mais confortáveis!), saio do hotel Timor, sigo pela avenida Nicolau Lobato, passando para o passeio do porto marítimo – já limpo de contentores, abrindo as vistas para o mar – no início da avenida de Motael (e assim diz a placa: antiga avenida Salazar), passo diante do palácio do governo, na praça da proclamação da independência, e sigo até ao jardim renovado, junto à ponte Habibie, demorando-me escassos minutos a olhar enigmaticamente para a foz, de um ausente rio, inundada de plástico, sobretudo garrafas de água, agora habitadas, seguramente, por mil e uma bactérias.

No regresso, observo o mercado (de fruta e legumes) mais tradicional de Díli, situado em Lecidere, onde um gato dormita junto a dois cachos de bananas, talvez para melhor saborear os seus doces e vitaminados sonhos.

Como tenho tempo, e como está maré baixa, paro um pouco, e vej0 que a baía se encheu de crianças-pescadoras, contribuindo, com as suas mãos débeis e com os seus pés leves, para a suficiência da economia familiar.

Quando dou comigo a tirar uma fotografia, embranquecida por nuvens de lenha que se mantêm sobre a cidade, sou surpreendido por um homem, que  certamente é o progenitor, acompanhado de uma menina, que é com toda a certeza sua filha, de cara ainda adormecida, e aparentando ter quatro ou cinco anos, que surge da estrada cheia de motorizadas e microletes, em passo largo, com pressa de entrar nas calmas e pródigas águas da baía de Díli.

Tirei ou não uma fotografia?

Não posso responder por que razão não o fiz, mas adivinho que tenha sido pelo respeito que aquela criança me suscitou, preferindo imaginar que a essa hora, ou um pouco mais tarde, estivesse a entrar no conforto de uma sala de educação pré-escolar.

 

 

 

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