Última Hora

O meu lado da albufeira

6 de Junho de 2023 | Helena Ramos Fernandes
O meu lado da albufeira
Opinião

A agricultura em Portugal está numa situação bem complicada.

Antes de emitir aqui a minha opinião sobre o assunto, apetece-me iniciar com um pouco de ironia. E deixo aqui as minhas desculpas a todos aqueles que não merecem este tipo de ironia, porque felizmente ainda existem pessoas decentes na política. Antevejo que não irei agradar a todos com a minha opinião, apenas acrescento que para o lado da agricultura as coisas não estão bem. Estamos no meio de uma albufeira quase vazia, mas que transborda aos olhos de certos políticos. Estamos numa situação bastante difícil neste sector que parece apenas servir para saciar a sua, a minha, a nossa barriga. Mas cuidado com os exageros, tem-me parecido que certos produtos provocam, voluntária ou involuntariamente, determinadas alucinações, sobretudo nos políticos.

Por obrigação profissional estou sempre atenta a tudo o que diz respeito a agricultura em Portugal. Mas tenho ouvido muito mais palavras do que visto acções. Palavras saídas de discursos bem elaborados e sempre lidos de forma pausada, sílaba a sílaba, e com um tom entusiástico. Será que isto lhe lembra alguém, caro leitor? Palavras que visam um propósito ou finalidade difícil de definir aqui, porque as magníficas acções proferidas nunca chegam a horas, e quando estas chegam, diria que é de fugir para bem longe de tão luminosas que são. Discursos políticos, proferidos com uma leitura perfeita. Como faz a Vossa, porque minha não é de forma nenhuma, ministra da Agricultura.

Entendo que quem não seja agricultor, ou trabalhe nesta área ou para a mesma, e que não tenha qualquer noção do que se passa neste lado da albufeira, acredite nesses discursos tão bem proferidos e que conseguem apresentar a albufeira quase a transbordar. E talvez seja por isso que ela se dirige para quem nada ou pouco sabe sobre o sector agrícola. E é para estes que estes discursos tão bem lidos, que se vão ouvindo aqui e ali, são dirigidos. Esta senhora, bem como outros ilustres políticos, usa o desconhecimento alheio para iludir a sociedade em geral com palavras, com milhões e com ideias luminosas e incandescentes que cegam propositadamente.

Se eu não estivesse a actuar neste sector, é bem provável que também caísse nessas ladainhas tão bem proferidas. A vossa ministra tem tudo controlado, e ultimamente tem vinda a afirmar que nem a seca vai perturbar os agricultores. Também insinua que a culpa, que nunca morre sozinha, do que não está bem, que é quase tudo por estes lados, possa vir de Bruxelas. Talvez, caro leitor, da couve de Bruxelas que a senhora tem vindo a comer ultimamente ao almoço ou ao jantar. Este legume, pelo facto de estar em stress hídrico, pela ansiedade que lhe foi passado pelo produtor que a cultivou, sabe-se lá porquê, poderá estar a desidratar algum órgão importante no raciocínio da Vossa ministra, bem como na sua assertividade. Nós, os actores desta peça da vida real, demasiado importante para todos, deixou de dar ouvidos a toda essa falta de assertividade, para não dizer nada mais impróprio. Esta senhora já não nos consegue iludir. Ela também já nem se importa com isso. E porque será, caro leitor? Talvez porque sabe que estamos do lado da razão.

E você, em qual dos lados da albufeira está? Do lado que está a transbordar, ou do lado onde me encontro, com uma albufeira quase vazia?

Comments are closed.