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12 de Setembro de 2023 | José Augusto Pacheco
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Opinião

É longo e gostoso o mês de agosto, e assim deveriam ser todos os meses do ano, se a vida fosse apenas festa e viagem.

Porém, a realidade de setembro é outra, assim como a de janeiro ou maio, embora dezembro seja dezembro, em função da quadra natalícia, que nos enche os corações de ternura, e a Páscoa, em março ou em abril, seja sempre um tempo de convívio.

Não falarei nem das festas, nem das viagens de agosto, mas somente de uma não-festa e de uma não-viagem.

Seria normal celebrar a festa litúrgica de Nossa Senhora das Neves a 5 de agosto no lugar de Santa, acrescentada de outros adereços que enobrecem a exceção do evento, por exemplo, de um arraial animado, mas já há muitos anos que não é realizada, sendo necessário andar séculos para trás, para constatar que a atual Capela pode ter assumido um lugar de destaque no edificado religioso da freguesia de Santa Maria de Paredes.

Na primeira metade do século XX, o Cónego Chouzal viveu em Santa e numa casa a que pertencia a referida Capela, tendo expressado a vontade de que a mesma passasse a ser pública, na condição de ser celebrada missa no dia 5 de agosto de cada ano.

Fiz muitas viagens em agosto, é certo, de um lado para outro, correndo uma quase-maratona geográfica, mas a que mais destaco é a ida à Maria Centeia, sobre a qual poderia ser escrito um conto, com os mesmos tons de miséria humana que Miguel Torga traçou cruelmente no de A Maria Lionça (que nasceu pobre, viveu pobre, morreu pobre, assumindo a expressão dum sofrimento levado aos confins do possível).

Maria Centeia tornou-se um lugar de não-viagens, tendo adormecido nas ribas do Águeda, na linha fronteiriça que separa Portugal de Espanha, na Beira Alta.

Ali está transformada em natureza, de uma mãe-natureza que produziu cereais para alimentar gerações de pessoas ao longo de anos sem fim, e que agora abriga coelhos, perdizes e javalis (e também muitas formigas e variados répteis), tendo por companhia o voo silencioso de águias à procura de alimento.

O nome de Maria Centeia, outrora de uma só mulher, de quem nada sabemos, ainda que tenha chorado as agrestes lágrimas da vida, assume-se como não-viagem de pobreza, porque ali está sorridente ou triste, quente ou fria, conforme é ditado pela meteorologia, sem bússola de trabalho.

Quieta-se num território demarcado, abriga-se na palma de um planalto e afaga-se na dor de muitas gerações de camponeses

 

P.S. A 2 de setembro, na Casa Courense de Lisboa, foi inaugurada uma exposição sobre os 20 anos do Notícias de Coura. Trata-se de uma justa iniciativa que foi dedicada a Manuel Tinoco, que bem a merece pela sua dávida pessoal e fraternal e pela sua dedicação a Paredes de Coura.

 

 

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