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QUOTIDIANOS

11 de Junho de 2019 | José Augusto Pacheco
QUOTIDIANOS
Opinião

De tempos a tempos é bom regressar a locais de que gostámos numa primeira visita. Assim acontece, por estes dias inicias de junho, com a Irlanda, mais precisamente Dublin, acrescida de uma pequena cidade, de igual população ao concelho de Paredes de Coura: Maynooth.

Trata-se de uma cidade universitária bem conhecida, distante 30 km de Dublin, respirando em toda a sua fisionomia urbana o verde ainda mais verde que o do Minho e oferecendo ao visitante um local de profunda quietude e de prolongado sossego.

De acesso fácil, a partir de Dublin, tanto de autocarro como de comboio, ainda que este deixe um pouco a desejar, pela qualidade inferior do serviço oferecido ao passageiro, a viagem vale pela paisagem deslumbrante, num planalto verde e controlado ao nível da construção, como se os prédios quase não existissem.

Depois de chegar, no interior da cidade, tudo se conjuga numa harmonia impressionante,  como se o tempo, feito de futuro, tivesse parado no presente, repleto de memórias de um passado que vem do século XII, tal como a formação de Portugal, mostrando as suas raízes de uma nação que se impõe ao mundo, pela economia, é certo, mas também pelo râguebi, e um pouco pelo futebol.

E Dublin já está para trás, numa paragem quase obrigatória, em que se estranha e depois se entranha o tempo, mais frio e cinzento, como se o sol fosse apenas meio astro, depois o trânsito da cidade, em que parar num semáforo exige redobrada atenção, olhando-se para todos os lados antes de transitar pela passadeira apressada, pois o verde tem um tempo demasiadamente insuficiente para os pés mais lestos, e ainda muito pior para os pés mais velhos e cansados, e ainda para os bares, que fazem parte da cultura urbana.

E entrar num deles pela noite dentro, por exemplo no Temple Bar, é uma experiência única, sendo agora permitido beber álcool até mais tarde, decerto pela exigência das regras do mercado.

E bebe-se e ouve-se música e canta-se ao ritmo da cerveja, meticulosamente tirada em copos que não deixam as gargantas secar.

Voltando a Maynooth, reparo que tudo é simbolicamente perfeito. Trânsito ordenado, qualidade de vida, espaços públicos, jardins, praças, castelos, universidades, colégios, bares, restaurantes e cafés.

Por norma, tenho a tendência para avaliar o custo de vida pelo café expresso, que em Portugal não chega a um euro, exceto em locais mais sofisticados. Como não posso evitá-lo, constato que nesta cidade de interior, em todo o lado, o café custa dois euros e setenta, sim, é isso mesmo, não me enganei.

Ora este preço diz tudo, apesar de poder ser considerado um produto que facilmente pode não ser consumido, sobretudo pela sua qualidade sofrível, quando comparado com o café que se bebe em Portugal.

Imagine-se que seria este preço a pagar nos cafés portugueses, mesmo nos de Coura. Seria caro, e bastante, é uma constatação, mas por trás desse preço existiria um outro nível de vida, em que o salário mínimo daria para viver no patamar médio da qualidade de vida.

Mas isso não impede que se observe um quadro chocante que presenciei na primaveril noite fria de Dublin: homens dormindo na rua, em recantos de prédios mais abrigados, tendo como colchão o chão duro de cimento e como manto de tristeza a solidão de noites intermináveis.

Assim, a vida, numa cidade cosmopolita e rica, é uma enorme mentira.

 

 

 

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