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26 de Abril de 2022 | José Augusto Pacheco
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Opinião

Nestas miniférias da Páscoa, revisitei algumas terras do centro do país, deambulando pela natureza e visitando o “Convento de Santa Cruz do Bussaco,” que tem a particularidade de ter sido a casa da Ordem dos Carmelitas Descalços, no período de 1630 a 1834. E perguntei-me, a partir do alto da torre sineira:  teria o Frei Redento da Cruz estado neste belo “deserto” religioso, situado numa das mais esplêndidas matas do país?

Lendo-se o “Resumo da Vida e Martírio do B. M. Redento da Cruz, Carmelita, natural de Paredes de Coura,” escrito por Narciso Alves da Cunha, a resposta é não, pois a construção do convento teria de acontecer até 1617, sabendo-se que a ordem para a sua edificação foi decidida anos mais tarde, em 1628. Por outro lado, se tivesse passado por terras do Luso teria sido na condição de militar e não na de frade.

Narciso Alves da Cunha diz que o Frei Redento da Cruz nasceu no lugar de Lisouros, freguesia de Cunha, numa família de muitos clérigos: “Era filho de Baltazar Pereira e de sua esposa D. Maria da Cunha – nobilíssima linhagem … membros ilustres nas esferas da ciência, preclaros na cultura das letras e singularmente piedosos se têm procriado no seio desta fidalga e veneranda família.”

Dos nove filhos do casal, quatro (três rapazes e uma rapariga) faleceram ainda meninos e três seguiram a vida clerical, sendo o mais conhecido Tomás Rodrigues da Cunha, nascido em 1598, e batizado na freguesia de Paredes de Coura, a 15 de março do mesmo ano, conhecido por Frei Redento da Cruz, quando “muito novo ainda, depôs a sua leal espada, despiu a nobre farda de soldado português, e calçando as sandálias dos Carmelita Descalços na cidade de Tata – império do Grão Mongol, trocou o nome de Tomás pelo de Redento da Cruz.”

Aos 19 anos de idade, na qualidade de militar, partira para o Oriente, na comitiva do conde do Redondo (D. João Coutinho), não se tendo deixado “embriagar com as grandezas da terra, nem com as vaidosas honrarias humanas, que cedo o procuraram, pois não tardou que o nosso ilustre conterrâneo fosse nomeado capitão da praça de Meliapor, cargo que o impunha à consideração pública e favor do Rei.”

Depois de ter estado em vários conventos (Tata, Diu e Goa), onde desempenhou cargos humildes (sacristão e porteiro, por exemplo), Frei Redento da Cruz  integrou, em 1638, uma embaixada portuguesa ao Rei de Achém (presentemente, denominada Aceh,  ilha de Sumatra, Indonésia), com vista ao estreitamento de relações de amizade, ou seja, ao comércio de especiarias. Devido aos interesses dos Holandeses, escreve Narciso Alves da Cunha,  “a comitiva em nome do vice-rei da Índia foi recebida com grande animosidade, tendo muitos deles sido submetidos a trabalhos forçados, cabendo a Fr. Redento da Cruz ser guardador de búfalos. Porque não renunciou à religião cristã, foi executado aos 40 anos de idade, juntamente com outros portugueses (cerca de 60),  a “28 ou 29 de novembro de 1638,” tendo-se destacado pela sua coragem e pelo seu misticismo, já que foi o primeiro a ser martirizado.

Em notas finais do livro, Narciso Alves da Cunha, inclui uma breve notícia do processo de beatificação de Fr. Redento da Cruz, que começou em 1642 e terminou a 10 de junho de 1900, depois de sucessivas tentativas da ordem dos Carmelitas. E mais diz Narciso, numa nota do seu Diário: “recebi um ofício de S. Exª. e Rev. Arcebispo de Braga, comunicando-me que aprovara o meu opúsculo e concedera 100 dias de indulgência a quem o lesse devotamente.”

 

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