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16 de Janeiro de 2024 | José Augusto Pacheco
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Opinião

Num intervalo de dias chuvosos, como é normal em Coura acontecer, o sol apareceu por inteiro, na sua forma de sol frio, acompanhado por um vento gélido, vindo de Norte, de enregelar os ossos.

A humidade desapareceu por algumas horas, com a promessa de regressar, ainda mais intensamente, na longa noite outonal.

Só por estes dias, em que estive fugazmente em Santa, compreendi verdadeiramente a expressão que, há tempos, um aluno de doutoramento, oriundo do Brasil, usou para se referir ao frio de outono, em dias de um sol esplêndido.

Mais concretamente disse que foi preciso vir a Portugal para saber que também havia um sol frio, que tanto lhe custava suportar, vestindo camisolas sobre camisola, usando um sobretudo bem robusto, e luvas e gorro, para suportar tal agrura climatérica.

Tenho de dizer, para melhor esclarecimento, que sempre vivera em Salvador da Baía, habituado ao clima tropical, e a uma temperatura que raramente é inferior a trinta graus.

Para resistir ao sol frio de Portugal, o recém-chegado baiano tudo fazia para enfrentar esse tal sol frio, que dizia ser insuportável, porque sempre acreditou que o sol era quente, como acontece no nordeste brasileiro, cidade onde viveu, e pregou aos peixes, o Padre António Vieira, e de onde é Jorge Amado, tendo aí escrito obras literárias inesquecíveis, como “Gabriela, Cravo e Canela” e “Capitães da Areia”.

Não, o sol é quente, não sendo possível ser frio, dizíamos-lhe com frequência, ripostando o baiano, de boca semicerrada, evitando falar muito para não despender energias, que o sol é frio, muito frio mesmo, e que não poderia dizer isso quando chegasse à Baía, pois ninguém acreditaria.

Mais diria, e que não confiariam nele, que num dia azul, com o sol brilhando de manhã e tarde, tremia de frio, mesmo que estivesse em espaços abertos, saboreando os raios que apenas frio lhe traziam.

Por isso, o seu comportamento era diferente, furtando-se às tarefas que lhe exigiam sair de casa, na medida em que não tinha a plumagem quente do pássaro chamado baiano, que provavelmente teria uma adaptação mais fácil ao frio de Portugal.

Neste pequeno testemunho, o baiano também disse que, quando retornasse ao Brasil, jamais diria que usou camisola, porque isso é algo que por lá designa roupa interior feminina. E outra também nunca diria, mas isso fica para um momento de boa disposição, já que aqui não a posso escrever.

 

 

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